Calculadoras gráficas: mais um elo na cadeia da evolução da tecnologia educativa
A Tecnologia tem estado sempre presente na sala de aula e não apenas na aula de Matemática; basta lembrar a evolução que sofreram os instrumentos de escrita, e o próprio aparecimento do livro de texto fez com que as aulas deixassem de ser meras leituras (os professores eram chamados os 'lentes'). Na aula de matemática, sempre se ensinou a tabuada mas também sempre se procuraram outros meios automáticos de cálculo. Podemos citar a utilização em diferentes épocas do ábaco ou dos quipus dos Incas.
Todos conhecem a revolução introduzida pelo aparecimento das tábuas de logaritmos . Sebastião e Silva e Silva Paulo (no ' Compêndio de Álgebra ') escrevem: "Se esta invenção tem chegado ao conhecimento de Kepler mais cedo ter-lhe-ia reduzido o longo trabalho de 22 anos de cálculos que fez para estabelecer as leis do movimento dos planetas. Foi esse conhecimento, decerto, que fez de Kepler um dos mais entusiastas divulgadores do método dos logaritmos".
Mais tarde apareceram as réguas de cálculo que ainda facilitavam mais a realização de cálculos que não exigissem demasiada precisão (continuando a usar-se tábuas de logaritmos se os problemas precisassem de respostas com números com 7, 10 ou mais casas decimais). A propósito do modo como o ensino dos logaritmos deveria reflectir a existência destes meios de cálculo e das máquinas de calcular mecânicas ,
já então com certa divulgação, os matemáticos portugueses Sebastião e Silva e Bento de Jesus Caraça envolveram-se em polémica nas páginas da ' Gazeta de Matemática ' em 1942/43. Não era fácil perceber então, como não é agora, qual o lugar da tecnologia no ensino da matemática.
Os computadores fizeram o seu aparecimento no rescaldo da II Grande Guerra e num artigo na revista ' Scientific American ' de 1949 podia ler-se: "Uma nova revolução está a ter lugar na tecnologia actual." Quando pensamos que se referia ao aparecimento do computador ENIAC que ocupava várias salas, necessitava de 19000 tubos de vácuo e tinha capacidades de cálculo inferior às das actuais calculadoras de bolso , podemos aperceber-nos de como a evolução da tecnologia se tem acelerado nos nossos tempos.
Actualmente observamos que existem computadores cada vez mais poderosos e mais baratos e calculadoras científicas de bolso cada vez com mais capacidade. Toda esta evolução tecnológica vem trazer implicações importantes para o ensino da matemática. Como afirmava Sebastião e Silva:
"Na verdade o uso dos computadores tem vindo a acentuar a importância do método experimental na investigação matemática, permitindo aperfeiçoar processos ou mesmo abrir caminhos inteiramente novos".(' Guia para a utilização do compêndio de Matemática ', 2º/3º vol, pg 86). "(...) logo na primeira aula se deve [pôr] o aluno em contacto com o conceito de aproximação. (...) a ideia dos métodos de aproximação, que domina toda a análise numérica moderna, ligada ao uso de computadores". (op.cit. pg 49)
Nestes últimos anos apareceu um novo tipo de calculadoras que vem trazer uma revolução ainda maior: as calculadoras gráficas . São na realidade pequenos computadores capazes de traçar uma grande variedade de gráficos num tempo espantosamente curto. E o desafio que trazem para a escola é ainda maior pelo facto de serem relativamente baratas. Com efeito, enquanto não podemos esperar a curto prazo que existam computadores em todas as escolas, podemos esperar que todos os alunos do Ensino Secundário venham a possuir uma calculadora gráfica a curto prazo. Num Encontro Internacional, ' Technology im Mathematics Teaching ', que decorreu em Setembro de 1993 na Universidade de Birmingham em Inglaterra, pude observar como o número e qualidade de experiências educativas com calculadoras gráficas é já considerável, se tivermos em conta que estas calculadoras foram lançadas há poucos anos. Tanto na Europa como nos Estados Unidos se observa como as calculadoras gráficas estão a entrar em força no ensino; por exemplo é muito mais fácil que para os computadores, atendendo ao seu preço, que a Associação de Pais de uma Escola ofereça à Escola 30 ou 40 calculadoras gráficas. Se é verdade que a maioria das experiências já feitas dizem respeito aos últimos do Ensino Secundário ou aos primeiros anos do Ensino Superior também é verdade que se observam experiências interessantes com alunos mais novos, mal começa a aparecer a ideia de função. A possibilidade que as calculadoras gráficas têm de traçar gráficos por pontos isolados ou unindo esses pontos, permite que se tire partido da sua utilização mal se começa a falar num referencial, não se podendo esquecer a sua utilização no traçado de gráficos relacionados com a Estatística.
Naturalmente que as calculadoras gráficas não podem fazer tudo aquilo que um computador pode fazer na aula de matemática (e muitas coisas interessantes foram também abordadas no referido encontro), mas a verdade é que as fabulosas capacidades das calculadoras gráficas estão disponíveis desde já. Muito há para fazer. Como integrar estas tecnologias com sucesso na aula de matemática? Continua a não ser fácil responder a esta questão. Num artigo publicado em 1981 eu tentava hesitantemente responder à questão ' Decorar a tabuada ou utilizar as calculadoras? '. A resposta a esta pergunta não pode ser nem a rejeição cega das calculadoras nem a sua utilização subserviente. Como afirmava Sebastião e Silva: "Resta o problema das tábuas. Existem tabelas de fórmulas (chamadas 'formulários'), como existem tabelas numéricas, listas telefónicas, catálogos ou enciclopédias. A finalidade é sempre a mesma: evitar um esforço inútil e mesmo incomportável de memória, dando maior grau de liberdade ao pensamento. Sem dúvida há fórmulas e tabelas numéricas que o aluno deverá ter sempre presentes, atendendo à frequência com que é preciso utilizá-las: por exemplo, as fórmulas trigonométricas da adição de ângulos e as tabuadas das operações elementares da aritmética. É tudo, afinal, uma questão de medida e de bom senso". (op.cit.pg 12)
Agora, passados 12 anos a questão já mudou: ' Traçar gráficos à mão ou utilizar as calculadoras gráficas? ' Claro que o princípio de resposta deve ser essencialmente o mesmo: "evitar um esforço inútil e mesmo incomportável de memória, dando maior grau de liberdade ao pensamento". Como é que isso se pode concretizar, é difícil dizer desde já. É necessário experimentar muito, investigar muito e manter o bom senso activo.
Qual o próximo elo na cadeia de evolução? Há alguns anos atrás eu fazia esta mesma pergunta e a resposta que escrevi foi: "Não sei. Talvez uma calculadora gráfica que permita calcular derivadas e primitivas (capaz de fazer 'manipulação simbólica') ou talvez um computador portátil que custe menos de 100 mil escudos e se possa ligar à linha telefónica para aceder às informações que não cabem na memória do computador." A primeira previsão está aí: a nova calculadora gráfica TI-92 consegue calcular derivadas e (algumas) primitivas, resolver sistemas literais, inverter matrizes, simplificar fracções de polinómios ou factorizar polinómios. Qual o impacto de uma máquina como esta na escola? É difícil dizer com seguranŤa; é preciso reflectir muito sobre o assunto.
Qual o próximo elo na cadeia de evolução? Não sei. Talvez uma calculadora gráfica que permita calcular muitas primitivas e que possa ligar-se por ondas radio ao computador de casa para buscar as informacoes que uma maquina portatil nao pode conter (como por exemplo, mais primitivas ainda), ou de aceder a grandes bases de dados para consulta rapida de informacao. Sejam estes ou outros, a escola tem de estar preparada para enfrentar estes desafios.
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