Pseudaria (4)
Depois de ter enviado o texto anterior para publicação no " Jornal de Mathematica Elementar " recebi ainda mais duas soluções aos problemas do primeiro texto, de Eduardo Leal (aluno do curso de Matemática da Faculdade de Ciências do Porto) e de Nuno Cardoso (aluno do curso de Matemática da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra), o que muito agradeço. Este espaço é tanto para alunos como para professores, independentemente do seu grau de ensino, ou para pessoas simplesmente interessadas pela Matemática.
No presente número aparece a solução da falácia 3 e é proposta uma nova falácia, a 6. Continuaremos a aguardar que os leitores enviem soluções ou comentários às falácias que vão sendo apresentadas (incluindo sobre aquelas de que já foram apresentadas soluções).
Consideremos uma circunferência de centro O e diâmetro [AB]. O comprimento da circunferência é dado por
Tracemos duas circunferências de diâmetros [OA] e [OB] e de centros C e D respectivamente.
Claro que o comprimento de cada circunferência é . Assim, a soma dos comprimentos das duas circunferências é igual a . Obtivemos o mesmo comprimento que o da circunferência inicial.
Tracemos agora quatro circunferências de diâmetros [AC], [CO], [OD] e [DB]. Tal como anteriormente o comprimento de cada circunferência é metade do comprimento de cada circunferência anterior. Assim, a soma dos comprimentos das quatro circunferências é igual ao comprimento da circunferência inicial.
Podemos continuar este processo, aumentando indefinidamente o número de circunferências. No limite, a soma dos comprimentos das circunferências será igual ao comprimento do segmento [AB]. Mas a soma dos comprimentos das circunferências é sempre igual ao comprimento da circunferência inicial. Ou seja, o comprimento de uma circunferência é igual ao seu diâmetro .
Solução:
Esta falácia é muito semelhante à número 2, como bem observa Eduardo Leal: o raciocínio está certo, a conclusão final ("No limite, a soma dos comprimentos das circunferências será igual ao comprimento do segmento [AB]") não é legítima. Este leitor enviou um trabalho em que analisa um problema semelhante às duas falácias, em que um trajecto é feito de forma cada vez mais sinuosa
aproximando-se de um trajecto limite. Como diz este leitor:
"Intuitivamente, eu seria levado a pensar que os trajectos, com inícios iguais e fins iguais, portanto deslocamentos iguais, ao convergirem para um trajecto em particular, fariam com que os espaços percorridos também convergissem para o espaço percorrido do trajecto limite. Tal não acontece necessariamente e sobre isso apenas posso concluir que é um facto interessante ."
Não é por "parecer" ser verdadeiro a partir de uma figura que um facto é necessariamente verdadeiro. E neste caso não é. A soma dos comprimentos das circunferências intermédias não converge para o comprimento da circunferência final (qualquer que seja a topologia aceitável que usemos para definir essa convergência). Logo, não é pelo facto de dois objectos se "aproximarem" que todas as suas propriedades se "aproximam" também.
Eis agora uma nova falácia para a qual solicito o envio de soluções:
Consideremos um quadrilátero [ABCD] de que um ângulo, C, é recto, um ângulo, D, é obtuso e cujos lados opostos [BC] e [AD] são iguais. Tracemos perpendiculares aos lados [AB] e [CD] obtendo os pontos E e F.
Provemos que estas perpendiculares não podem ser paralelas, por redução ao absurdo. Se o fossem, [AB] e [CD] também seriam paralelas, o ângulo B seria recto e [AD], igual a [BC], deveria confundir-se com a perpendicular baixada de D sobre [AB]: o ângulo D seria então recto, contrariamente à hipótese.
Sendo assim, as perpendiculares que passam pelos pontos E e F encontram-se num certo ponto I. Apenas as duas hipóteses seguintes são aceitáveis: I está no interior do quadrilátero dado ou está no seu exterior.
1º Suponhamos primeiro que I está no interior de [ABCD].
Unamos o ponto I aos quatro vértices do quadrilátero como indica a figura. Os triângulos [AID] e [BIC] são iguais visto terem os três lados iguais (pois de I sai uma perpendicular ao ponto médio dos lados [AB] e [CD]). Logo, o ângulo ADI e o ângulo BCI são iguais. Se, a cada um destes dois ângulos juntamos um mesmo ângulo (FDI igual a FCI), concluímos que o ângulo C e o ângulo D são iguais, isto é, um ângulo agudo e um ângulo obtuso são iguais . 2º Suponhamos agora que I está no exterior de [ABCD].
Unamos de igual modo o ponto I aos quatro vértices do quadrilátero como indica a figura. Os triângulos [AID] e [BIC] continuam a ser iguais. Logo, o ângulo ADI e o ângulo BCI ainda são iguais. Se, de cada um destes dois ângulos retiramos um mesmo ângulo (FDI igual a FCI), concluímos que o ângulo C e o ângulo D são iguais, isto é, um ângulo agudo e um ângulo obtuso são iguais .
Endereços para o envio de soluções:
endereço postal:
Departamento de Matemática
Universidade de Coimbra
Apartado 3008
3000 Coimbra
endereço electrónico: jaimecs@mat.uc.pt
endereço na WEB: http://www.mat.uc.pt/~jaimecs/pseud/index.html