O Ensino Superior está no centro da questão
nacional
Entrevista a João Filipe Queiró
Jornal de Letras, Artes e Ideias, n.º 1225, 13-26 de
Setembro de 2017.
Qual a temática e o ângulo de abordagem deste seu O
Ensino Superior em Portugal?
Trata-se de um curto ensaio sobre a sua importância para o país,
da sua organização, da sua história recente e dos principais
problemas que se lhe colocam. O ponto de vista não é do estudante,
nem o do professor, nem o do dirigente ou gestor. Embora
potencialmente interessantes, essas são perspectivas internas,
particulares. O texto dirige-se mais ao cidadão com vontade de
compreender o sentido das políticas públicas nacionais e
sistémicas.
Quanto aos temas entre eles estão as missões do Ensino Superior e
o sistema binário (politécnicos e universidades), a regulação do
sistema, as vagas e o acesso, o financiamento, as propinas e as
bolsas, os muitos aspectos da autonomia e da governação das
instituições de Ensino Superior, a investigação e a avaliação, o
ensino e a sua integridade. A seu propósito procurei chamar a
atenção para debates e alternativas – a respeito das quais, como
sociedade, temos de pensar e escolher – sem necessariamente se
tomar posição, preferindo-se descrever e analisar os valores e
tensões em presença.
Escreveu este novo livro com que objectivo?
Antes de mais, informativo: o que é o Ensino Superior, para que
serve, que problemas enfrenta. Há um grande desconhecimento
público em relação ao Ensino Superior, o seu valor estratégico, a
sua complexidade e variedade, as suas diferenças em relação ao
Ensino Básico e Secundário. Tentar combater esse desconhecimento é
a principal razão para a existência do livro.
Que ideias principais defende?
A principal, que influencia todo o texto, é que o Ensino Superior
está no centro da questão nacional, do que significa Portugal ser
um país hoje. A elevação do nível cultural dos portugueses e da
sua preparação é essencial para a permanência de Portugal como
comunidade autónoma com um mínimo de identidade e capacidade de
afirmação no mundo. Um país deficitário em matéria cultural e
intelectual perderá progressivamente o controlo sobre o seu
destino.
Por outro lado, existe uma relação causal – esclarecida com
clareza cada vez maior pela investigação empírica – entre o nível
educativo da população e o desenvolvimento económico. A este
propósito deve também referir-se a actividade de incubação de
empresas em instituições de Ensino Superior, em vários casos feita
a sério e há muitos anos, bem como as múltiplas relações das
universidades e politécnicos com a economia e a sociedade.
Que outros interesses estão em causa?
Outro interesse colectivo tem que ver com a natureza das
actividades levadas a cabo nas instituições de Ensino Superior.
Nestas deve escapar-se ao frenesim alimentado pelas notícias e
pseudo-notícias do quotidiano e praticar-se o estudo e o debate
lentos, reflectidos, informados. Pessoas formadas em ambientes
assim contribuirão para uma opinião mais preparada para elevar a
qualidade do debate público, e portanto do próprio processo
político democrático, por aumentar o nível de exigência dos
cidadãos.
Aos fins ou interesses colectivos juntam-se os perfis e interesses
individuais dos estudantes, desde o acesso a uma profissão
específica até aos gostos pessoais, que devem também ser
valorizados, pois a realização de cada cidadão é uma riqueza em
si. Os estudos superiores podem ainda ser vistos como um
investimento numa boa retribuição mais tarde. O Ensino Superior
permanece como um dos poucos mecanismos de efectiva mobilidade
social e económica e de igualdade de oportunidades.