Agradeço aos Profs. António Machiavelo, José Carlos Santos e João
Nuno Tavares o convite para apresentar o livro “43 miniaturas
matemáticas”.
Estou aqui com muito gosto, pelo respeito e admiração que tenho
por estes colegas e pelos restantes autores do livro (onze ao
todo), bons matemáticos e ao mesmo tempo matemáticos cultos, e
muito dinâmicos na sua acção intensa de divulgação da Matemática,
de várias formas.
Hesitei antes de aceitar este convite, mas apenas porque, na
altura, embora já tivesse comprado o livro, ainda não tinha
acabado de o ler e ainda não tinha formado uma opinião sobre ele.
Se viesse a formar uma opinião negativa, não seria correcto
aceitar o convite. Aplicando as regras da lógica, pode-se concluir
que, como estou aqui, não formei uma opinião negativa, o que
retira algum suspense ao lançamento.
Mas também não vou dizer só que formei uma opinião positiva. De
facto, este livro, a sua natureza e a sua organização levantam
algumas interrogações que gostaria de partilhar convosco.
Começo pelo óbvio. Tenho 20 minutos para falar, o livro tem 43
capítulos e, portanto, se quisesse falar sobre todos – e se não
tivesse já gasto algum tempo – teria cerca de 28 segundos para
cada capítulo.
Além de impossível, isso seria injusto. Os capítulos são muito
curtos – são miniaturas – mas não se deixam resumir em
pouco tempo. É pena, porque ao não falar de Matemática não poderei
falar da beleza, da profundidade e da elegância dos temas
abordados.
Esta observação leva aliás à primeira interrogação que nos ocorre.
Os capítulos tratam de temas matemáticos importantes e variados
(números, geometria, funções, astronomia) mas, com uma ou duas
excepções, cada capítulo não tem mais de três páginas. Posso ser
exacto e dizer que 38 têm três páginas, dois têm duas páginas,
dois têm quatro páginas e um (no que claramente é um abuso) tem
seis páginas.
E a primeira interrogação é esta: a miniatura é um género
literário adequado à Matemática?
Noutras áreas pode ser. Só para dar um exemplo: Paulo Merêa, um
dos maiores historiadores portugueses do século XX – e, como é
natural, completamente desconhecido pelo grande público – deixou
parte substancial da sua obra em textos curtos, que são
considerados preciosos pelos especialistas.
Mas na Matemática? A Matemática é lenta, exige mastigação, não vai
lá com flashes, por muito que alguns filmes sobre
matemáticos queiram dar essa impressão. Não há nenhum grande
matemático que não seja um mouro de trabalho (sem conotações
negativas da palavra “mouro”…). E os matemáticos mais pequenos,
como nós, têm de trabalhar ainda mais…
A resposta a esta interrogação não é evidente para mim. O género
escolhido para as exposições é uma das características mais
originais do livro. Os capítulos tratam de assuntos importantes –
não são temas de pequeno pormenor – mas de forma extremamente
abreviada. Não há nenhuma incorrecção (há uma gralha aqui ou ali)
mas há pouquíssimas explicações. Vai-se ao essencial, usam-se
símbolos e terminologias sem apresentação prévia, e em muitos
casos usam-se até fórmulas.
Nota-se que os autores têm total segurança nas matérias que estão
a expor, que às vezes parecem fáceis mas não são. As palavras são
poucas, mas são bem escolhidas. Há tempo para falar em
aplicações e em ligações dos temas a questões culturais. Há
muitíssimas figuras. Os capítulos são frequentemente acompanhados
por notas à margem intituladas “Sabia que?” Mas tudo isto em três
páginas.
Isto leva-nos directamente à segunda interrogação. A que
público se dirige este livro? Os organizadores, no prefácio,
não fogem à questão e respondem que é “um público geral, curioso
em saber mais e sem aversão a experimentar um pouco do sabor da
matemática”. A dúvida surge logo: quem é esse público?
Creio que os organizadores pensaram mais nisto do que dão a
entender no prefácio. E que têm em mente professores (não só de
Matemática) dos vários níveis de ensino, alunos interessados do
superior, do secundário e até do básico, em alguns casos, e, de
uma forma geral, pessoas que não têm medo dos símbolos e podem ter
estudado alguma Matemática. Um exemplo clássico: os
engenheiros. E até os matemáticos profissionais: muitos dos
assuntos serão completamente familiares para eles, mas de certeza
que terão oportunidade de aprender alguma coisa aqui e acolá.
Quanto mais pensei nisto mais me convenci de que o “género
miniatura”, que é uma originalidade na Matemática, pode ser um
achado. Como dizia Fernando Pessoa numa publicidade da Coca-Cola,
“primeiro estranha-se, depois entranha-se”. Fui-me habituando ao
ritmo das três páginas e, perto do fim, já me custou ler o
capítulo de seis páginas: era longo demais. (Não poderia ser
dividido em dois: 43 é um número muito mais bonito do que 44.) E
convenci-me de que foi de propósito: não há nenhuma das histórias
de três páginas que não possa ser contada em 30 (o que daria um
livro de 1300 páginas). Mas a ideia é pôr o ónus do lado do
leitor: se ficar fascinado, vai à procura e escreve ele as outras
27.
Uma terceira interrogação é: como ler um livro destes? Não é um
livro para se ler todo de seguida, é um livro de cabeceira.
Um capítulo pode ser, conforme o gosto de cada leitor, o início de
uma exploração pessoal para saber mais, que é auxiliada pela lista
de referências bibliográficas indicadas no fim do livro.
Portanto, este é um livro para fazer companhia ao leitor durante
muito tempo: quem quiser explorar a fundo todos os temas
apresentados acabará lá para 2023.
Como disse no princípio, quando comecei a ler o livro, há uns três
meses, hesitei na minha apreciação. Mas depois formei,
convictamente, a opinião de que é um trabalho com grande interesse
cultural. Os organizadores e os autores estão de parabéns, o
Centro e o Departamento de Matemática do Porto mais uma vez provam
que são locais de Ciência mas também de Cultura, que aqui deve
haver investigação mas também abertura aos outros, aos
professores, aos alunos pré-universitários, à sociedade em geral.
Lançar o livro é dá-lo a conhecer. Mas provavelmente já todos os
presentes o conhecem, e quem não o tem deve ir comprá-lo já, antes
que esgote, e a tempo de o oferecer no Natal. Não será uma prenda:
serão 43 prendas, cada uma delas uma possibilidade de exploração e
aprendizagem.
Afinal, o livro custa 10 euros, o que dá cerca de 23 cêntimos por
capítulo. Não me parece caro o preço destas miniaturas.