Seydou Keita

Colégio das Artes, Largo D.Dinis
Horário: 14.00-17.30
Sábado/Domingo: 10.00-12.30, 14.00-17.30
Entrada livre

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A descoberta das fotografias de Seydou Keita foi um acaso feliz. As que foram apresentadas na Fondation Cartier foram realizadas em Bamako, Mali entre 1950 e 1977. Chegam-nos hoje e impõem-se com uma evidência rara. O que é fascinante, talvez, é a sua extrema elegância e a simplicidade que delas emana. Os jogos de motivos, nomeadamente os do vestuário e dos fundos, criam composições abstractas onde, por vezes, surge um rosto, um ombro,umas mãos. Sofisticação e requinte também nas poses e nos pormenores: como aquele sapato pousado no vestido de uma mulher. É nessa elegânca que calmamente se instalam os modelos e é então que uma verdade, uma autenticidade, uma ternura, irradiam dos seus rostos. Ficamos a dever a André Magnin a sorte de ter descoberto a obra de Seydou Keita, a Jean Pigozzi a generosidade de emprestar as fotografias expostas, a Seydou Keita o prazer de apresentar a sua obra em Paris.
Hervé Chandès
Conservador da Fondation Cartier pour l'art contemporain Paris,
Outubro de 1994

"Comecei a fotografar em 1945 em Bamako, sozinho, sem saber nada, com uma câmara 6 x 9 que o meu tio me tinha trazido do Senegal. Também me tinha dado dinheiro para comprar filme. Foi assim que aconteceu. Sinceramente, é um ofício que tentei fazer o melhor possível, gostei tanto da fotografia. A princípio, fotografei a família. E aí, algumas poses "davam", outras não. De facto, comecei mal: as pessoas mexiam-se e eu também devia tremer um bocadinho. Quando imprimia, pareciam uns esqueletos. Estás a ver, não tinha qualquer formação. Pedia ao cliente para me pagar adiantado o preço da prova que mandava fazer ao Pierre Garnier ou ao Mountaga, mais velho do que eu e que me ensinou a revelar. E se as fotografias não "saíam", então é que eram problemas: os clientes não ficavam nada contentes... mas eles é que se tinham mexido!

[...] Em 1948, quando Mountaga soube que eu já tinha conhecimentos, passou-me o laboratório. Revelava nessa altura só a preto e branco. Já havia fotografia a cor, mas era preciso mandar para França. De qualquer maneira, não me interessava nada. Para mim, o preto e branco é que era bonito. Nessa altura, havia quatro fotógrafos Bamako: Youssouf Traoré, Boudjala Kouyaté, Mountaga Kouyaté e eu, também havia o Moumoune Koné. Malik Sidibé apareceu depois. Todos fazíamos retratos, mas dizia-se que os meus "cartões" é que eram bonitos. Tinha o carimbo Photo KEITA que punha em todas as provas.

[...] Em 1949, comprei uma câmara grande formato e comecei a usar negativos 13 x 18. As provas eram do mesmo tamanho, foi por isso que preferi o 13x18. Tinha posto nas paredes do estúdio muitos modelos e amostras das fotografias que fazia: homens e mulheres em retratos de busto, sozinhos ou aos pares e até mesmo em grupos de seis; em pé, sozinhos, em grupos, em família... Os clientes diziam-me: «Quero ser fotografado assim, estás a ver? queria assim.» E eu fazia assim. Mas às vezes não dizia nada bem com eles. Propunha-lhes outra posição, que ficava melhor, e então realmente resolvia qual era a melhor posição, e não me enganava. Vinham muitos clientes, mas era ao sábado que o negócio era melhor: às vezes vinham mais de cem pessoas. Às vezes até faziam fila. Gente com dinheiro, sobretudo funcionários e comerciantes. Até o nosso primeiro presidente da República lá foi. Fazia as provas durante a noite e o acabamento no dia seguinte de manhã, mesmo antes de os clientes virem buscar as fotografias."

[...] Com a 13 x 18, o meu primeiro fundo foi a coberta da cama. Depois mudava de fundo de dois em dois anos; é assim que agora consigo datar os meus negativos. Às vezes o fundo ficava bem com a roupa, sobretudo no caso das mulheres. Mas era por acaso.

[...] Nessa altura, a cultura dos antepassados começava a desaparecer: a gente da cidade punha-se a vestir à europeia, eram muito influenciados pela França. Mas nem toda a gente se podia vestir assim. No estúdio, tinha três fatos europeus diferentes, com gravata, camisa, sapatos, chapéu... tudo. E também adereços: canetas, flores de plástico, aparelhos de rádio, telefone, que punha à disposição dos clientes.

[...] Quanto às mulheres, o trajo nessa altura ainda não tinha mudado. As roupas ocidentais, como a saia, só apareceram no final dos anos Sessenta. As mulheres traziam saias compridas. Então eu punha-as em posição e depois ajeitava o vestido. Era preciso, custasse o que custasse, que os penteados ficassem bem na fotografia. As mãos, os dedos compridos, finos, as jóias... tinham muita importância; as mulhers eram muito sensíveis a isso. Era um sinal de riqueza, de elegância, de beleza.

[...] Nunca vi nem conheci fotógrafos estrangeiros: eu nunca saía. Também não conhecia as fotografias deles. Aqui não se encontrava nenhuma revista francesa, nem americana. A única coisa que se conseguia encontrar era o catálogo da Manufrance.

[...] Tanto trabalhava com luz natural como com luz artificial. Os clientes preferiam as "fotografias de noite", que eram mais pálidas, mas eu preferia a luz natural.

[...] Os clientes gostavam muito das minhas fotografias por serem nítidas, precisas, porque a luz era bonita e também porque a encenação lhes agradava. Sei isso muito bem. As minhas fotografias eram mesmo boas.

[...] Quando olho para as minhas fotografias, hoje, vejo que não mudaram nada, nem mudaram de cor. Trabalhei sempre com a mesma câmara até ao fim, em 1977.

[...] Conservei os negativos: estão lá todos, os clientes podiam encomendar outras provas. Os clientes nunca reclamaram; se não fosse assim, nunca mais teriam voltado ao estúdio.

[...] Se tu gostas das minhas fotografias, lá deves saber porquê. Sei que há muitas das minhas fotografias que são boas, e é por isso que gostas do meu trabalho.

[...] Deixei de fazer fotografias quando a cor começou a fazer sucesso. Agora agrada muito, mas são as máquinas que fazem o trabalho. Hoje há muita gente que se diz fotógrafo, mas também há muitos que não sabem nada de nada".
Declarações recolhidas por André Magnin, Bamako, Agosto de 1994 * Pierre Garnier tinha uma loja de artigos fotográficos, em Bamako.

Cortesia Fondation Cartier pour l'Art Contemporain


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