PROP. XI. PROB.
De um ponto dado em uma linha recta dada
levantar uma perpendicular sobre a mesma recta dada ( Fig.
29 ).
Fig. 23 |
Seja dada a recta AB, e nella o ponto C. Se deve do ponto C levantar uma perpendicular sobre a recta AB.
Tome-se na recta qualquer ponto D, e ponha-se CE=CD ( Pr. 3, 1 ), e sobre DE faça-se ( Pr. 1, 1 ) o triangulo equilatero DFE. Tire-se finalmente a recta FC. Digo, que FC é perpendicular sobre a dada AB no ponto C.
Por ser DC=CE, e FC commum; as duas DC, CF
serão eguaes ás duas EC, CF, cada uma a cada uma. Mas é a base
DF=FE outra base. Logo será o angulo DCF=ECF ( Pr. 8, 1
); e estes angulos são formados um de uma, e outro de outra
parte da mesma linha. Mas quando uma recta, cahindo sobre outra,
faz os angulos de ambas as partes eguaes entre si, estes angulos
são rectos ( Def. 10 ). Logo os angulos DCF, FCE são
rectos, e assim temos levantado a perpendicular FC sobre a recta
dada AB, e do ponto dado C.
COROL. Com isto podemos demonstrar, que duas linhas rectas não podem ter um segmento commum ( Fig. 30 ).
Fig. 30 |
Tenham as duas rectas ABC, ABD, se possivel, o
segmento commum AB. Do ponto B levante-se a perpendicular BE
sobre AB. Porque ABC é uma linha recta, será o angulo CBE=EBA (
Def. 10 ). Do mesmo modo sendo ABD uma linha recta, será
o angulo DBE=EBA. Logo será DBE=CBE, isto é, um angulo menor
egual a um maior, o que não póde ser. Logo duas linhas rectas
não podem ter um segmento commum.
PROP. XII. PROB.
Conduzir uma perpendicular sobre uma linha recta dada indefinita de um ponto dado fóra d'ella ( Fig. 31 ).
Fig. 31 |
Seja dada uma linha recta AB, e fóra d'ella o ponto C. Deve-se do ponto C conduzir uma perpendicular sobre a recta AB.
Da outra parte da recta AB tome-se um ponto qualquer D, e com o centro C, e o intervallo CD se descreva ( Post. 3 ) o circulo EGF, que corte a recta AB nos pontos F, G; e a recta FG se divida pelo meio ( Pr. 10, 1 ) no ponto H, e se tirem as rectas CF, CH, CG. Digo, que a recta CH é perpendicular sobre a recta indefinita AB.
Sendo FH=HG, HC commum, as duas FG, HC serão
eguaes ás duas HG, HC, de cada uma a cada uma. Mas é a base
CF=CG ( Def. 15 ) outra base. Logo será o angulo CHF=CHG
( Pr. 8, 1 ), e por consequencia estes angulos, sendo
adjacentes á mesma linha CH, serão rectos, e a recta CH, que
parte do ponto C, será perpendicular sobre a recta dada
indefinita AB, como se pedia.
PROP. XIII. THEOR.
Uma linha recta, cahindo sobre outra linha recta, faz com esta, ou dous angulos rectos, ou dous angulos eguaes a dous rectos ( Fig. 32, 33 ).
Fig. 32 |
Fig.33 |
Caia a recta AB sobre a recta CD, fazendo com esta os dous angulos CBA, ABD. Digo, que os angulos CBA, ABD ou são dous rectos, ou são eguaes a dous rectos.
Porque se for o angulo CBA=ABD ( Fig. 32
), claro está, que são rectos ( Def. 10 ). E quando não
seja assim: do ponto B ( Fig. 33 ) se levante ( Pr.
11, 1 ) sobre CD a perpendicular BE. Logo os angulos CBE, e EBD
são dous rectos. E porque o angulo CBE é egual aos dous CBA,
ABE, ajunctando de uma e outra parte o mesmo angulo EBD, serão
os dous CBE, EBD eguaes aos tres CBA, ABE, EBD ( Ax. 2 ).
Tambem sendo o angulo DBA egual aos dous DBE, EBA, ajunctando de
ambas as partes o angulo commum ABC, serão os dous DBA, ABC
eguaes aos tres DBE, EBA, ABC. Mas estes tres angulos são eguaes
aos dous CBE, EBD; e as quantidades, que são eguaes a uma
terceira, são eguaes entre si ( Ax. 1 ). Logo os dous
angulos CBE, EBD são eguaes aos dous DBA, ABC. Mas CBE, EBD são
dous recto. Logo os dous angulos DBA, ABC são eguaes a dous
rectos.
PROP. XIV. THEOR.
Se um ponto de uma linha recta qualquer concorrerem de partes oppostas duas rectas, fazendo com a primeira recta os angulos adjacentes eguaes a dous rectos, as rectas, que concorrem para o dito ponto, estarão em direitura uma da outra ( Fig. 34 ).
Fig. 34 |
No ponto B da linha recta AB concorram de partes oppostas as duas BC, BD, fazendo com a
recta AB os angulos adjacentes ABC, ABD eguaes a dous rectos. Digo, que BD está em direitura de CB.
Se BD não está em direitura de CB, esteja-o
BE, de sorte que CBE seja uma só linha recta. Cahindo a recta AB
sobre a recta CBE; os angulos ABC, ABE serão eguaes a dous
rectos ( Pr. 13, 1 ). Mas tambem são eguaes a dous rectos
os angulos ABC, ABD. Logo os dous angulos CBA, ABE são eguaes
aos dous CBA, ABD. Logo tirando de uma e outra parte o angulo
commum CBA, ficará o angulo ABE=ABD ( Ax. 3 ); isto é,
um angulo menor egual a um maior, o que não póde ser. Logo a
recta BE não está em direitura com BC. O mesmo se póde
demonstrar de qualquer outra recta fóra de BD. Logo as rectas
CB, BD estão em direitura.
PROP. XV. THEOR.
Se duas linhas rectas reciprocamente se cortarem, farão os angulos verticalmente oppostos eguaes entre si ( Fig. 35 ).
Fig. 35 |
Cortem-se as duas rectas AB, CD reciprocamente no ponto E. Digo, que será o angulo AEC=DEB, e CEB=AED.
Porque a recta AE cai sobre a recta CD, serão os angulos CEA, EAD eguaes a dous rectos ( Pr. 13, 1 ). Do mesmo modo, cahindo DE sobre AB, serão tambem os angulos AED, DEB eguaes a dous rectos ( Pr. 13, 1 ). Logo os angulos CEA, AED são eguaes aos angulos AED, DEB. Logo tirando de uma parte e outra o commum AED, ficará CEA=BED.
Com a mesma demonstração se prova ser
CEB=AED.
COROL. 1. D'isto se póde deduzir, que
quando duas rectas se cortam, fazem quatro angulos eguaes a
quatro rectos.
COROL. 2. E que todos os angulos ao redor de
um mesmo ponto são eguaes a quatro rectos.
PROP. XVI. THEOR.
Produzido um lado qualquer de qualquer triangulo, o angulo externo sempre é maior, que cada um dos angulos internos e oppostos ( Fig. 36 ).
Fig. 36 |
Seja o triangulo ABC, cujo lado BC seja produzido para a parte D. Digo, que o angulo externo ACD é maior, que qualquer dos internos e oppostos CBA, BAC.
Divida-se o lado AC em duas partes eguaes ( Pr.
10, 1 ), no ponto E; e tirada a recta BE, esta se continue até F
de sorte que seja BE=EF. Tire-se FC, e o lado AC seja produzido
para G. Sendo AE=EC, e BE=EF, as duas AE, EB serão eguaes ás
duas CE, EF, cada uma a cada uma. Mas é o angulo AEB=CEF ( Pr.
15, 1 ) por serem estes angulos verticalmente oppostos. Logo a
base AB é egual á base CF: e o triangulo AEB egual ao triangulo
CEF; e os mais angulos eguaes aos mais angulos ( Pr. 4, 1
), cada um a cada um, segundo ficam oppostos a lados eguaes. Logo
será o angulo BAE=ECF. Mas é o angulo ECD>ECF. Logo será
tambem ACD>BAE. Com o mesmo discurso, dividido pelo meio o
lado BC, se demonstra ser o angulo BCG, isto é, ACD>ABC ( Pr.
15, 1 ).
PROP. XVII. THEOR.
Dous angulos de um triangulo qualquer, tomados de qualquer modo, que se quiser, são menores que dous rectos ( Fig. 37 ).
Fig. 37 |
Seja o triangulo ABC. Digo, que dous angulos quaesquer do triangulo ABC, tomados junctamente, são menores que dous rectos.
Produza-se BC para D. Sendo no triangulo ABC o
angulo externo ACD maior ( Pr. 16, 1 ), que o angulo
interno e opposto ABC; se a um e outro se ajunctar o angulo
commum ACB, os angulos ACD, ACB junctos serão maiores, que os
angulos ABC, ACB. Mas ACD, ACB são eguaes a dous rectos ( Pr.
13, 1 ). Logo os dous angulos ABC, BCA são menores, que dous
rectos. Do mesmo modo podemos demonstrar serem os angulos BAC,
ACB; e os angulos CAB, ABC menores que dous rectos.
PROP. XVIII. THEOR.
Em qualquer triangulo o lado maior oppõe-se ao angulo maior ( Fig. 38 ).
Fig. 38 |
Seja o triangulo ABC, e seja o lado AC>AB.
Digo, que é o angulo ABC>BCA. Sendo AC>AB, se poderá
tomar AD=AB ( Pr. 3, 1 ). Tire-se a recta BD. Porque no
triangulo BDC o angulo externo ADB é maior, que o angulo interno
e opposto BCD ( Pr. 16, 1 ); e é ADB=ABD, por ser AB=AD (
Pr. 5, 1 ); será o angulo ABD>ACB, e por consequencia
ABC muito maior que ACB.
PROP. XIX. THEOR.
Em qualquer triangulo o angulo maior fica opposto ao lado maior ( Fig. 39 ).
Fig. 39 |
Seja o triangulo ABC, e seja o angulo ABC>BCA. Digo, que é o lado AC>AB.
Se AC não é maior, será egual, ou menor, que
AB. Mas não é egual, porque seria ABC=ACB ( Pr. 5, 1 ),
contra a suposicão. Logo não é AC=AB. Tambem não pode ser
AC<AB, porque seria ABC<ACB ( Pr. 18, 1 ) contra a
hypothese. Logo não é AC<AB. Logo segue-se ser AC>AB.
PROP. XX. THEOR.
Em qualquer triangulo dous lados, tomados de qualquer modo que se quizer, são maiores que o terceiro ( Fig. 40 ).
Fig. 40 |
Seja o triangulo ABC. Digo, que dous quaesquer lados do triangulo ABC são maiores que o terceiro; isto é, os lados BA, AC são maiores que o lado BC; os lados AB, BC são maiores que o lado AC; e os lados BC, CA são maiores que o lado AB.
Produza-se BA para D, e posta AD=CA ( Pr.
3, 1 ), tire-se a recta DC. Sendo DA=AC, será o angulo ADC=ACD (
Pr. 5, 1 ). Mas é BCD>ACD. Logo será BCD>ADC. E
porque no triangulo DCB é o angulo BCD>BDC; e ao angulo maior
fica opposto o lado tambem maior ( Pr. 19, 1 ), será o
lado DB>BC. Mas DB é egual aos dous lados junctos BA, AC.
Logo os dous lados BA, AC são maiores que o lado BC. Do mesmo
modo se prova, que os lados AB, BC são maiores que o lado CA; e
que os lados BC, CA são maiores que o lado AB.
PROP. XXI. THEOR.
Se sobre os extremos de um lado de um triangulo estiverem postas duas rectas dentro do mesmo triangulo, estas serão menores que os outros dous lados do triangulo, mas comprehenderão um angulo maior do que o angulo, que fica opposto ao lado, sobre cujos extremos estão postas as dictas rectas ( Fig. 41 ).
Fig. 41 |
Sobre os extremos B, C do lado BC do triangulo ABC estejam postas as rectas BD, DC dentro do mesmo triangulo ABC. Digo, que as rectas BD, DC são menores que os outros lados do triangulo BA, AC; mas que o angulo BDC é maior que o angulo BAC.
Produza-se BD até E. Porque dous quaesquer lados de um triangulo são maiores que o terceiro ( Pr. 20, 1 ); serão os dous lados BA, AE do triangulo ABE maiores que o lado BE. Ajuncte-se a uma e outra parte a recta EC. Logo BA, AC serã maiores ( Ax. 4 ) que BE, EC. E porque no triangulo CED os dous lados CE, ED são maiores que o lado CD, ajunctando a commum DB, serão as duas CE, EB maiores ( Ax. 4 ) que as duas CD, DB; e por consequencia BA, AC, serão muito maiores que BD, DC.
E porque em qualquer triangulo o angulo externo
é maior que o interno e opposto ( Pr. 16, 1 ), no
triangulo CDE será o angulo externo BDC>CEB. Pela mesma
razão no triangulo ABE deve ser o angulo CEB>BAC; e por
consequencia será o angulo BDC muito maior que o angulo BAC.
PROP. XXII. PROB.
Construir um triangulo com tres linhas rectas eguaes a tres outras dadas, entre as quaes duas, tomadas como se quizer, sejam sempre maiores que a terceira ( Fig. 42 ).
Fig. 42 |
Sejam dadas as tres rectas A, B, C, das quaes duas tomadas como se quizer, sejam maiores que a terceira, isto é, as duas A, B>C; as duas A, C>B; e as duas B, C>A ( Pr. 20, 1 ). Deve-se formar um triangulo de tres lados eguaes ás tres rectas dadas A, B, C.
Tire-se de qualquer ponto D uma recta infinita DE, e ponha-se ( Pr. 3, 1 ) DF=A; FG=B; e GH=C. Com o centro F, e o intervallo FD se descreva ( Post. 3 ) o circulo DKL; e com o centro G, e o intervallo GH se descreva o circulo KLH. Tirem-se as rectas KF, KG. Digo, que o triangulo KFG é o que se pede.
Sendo o ponto F o centro do circulo DKL, será FD=FK ( Def. 15 ). Mas é FD=A. Logo será FK=A. E sendo o ponto G o centro do circulo LKH, será GH=GK. Mas é GH=C. Logo será GK=C. Mas se tem tomado FG=B. Logo as tres rectas KF, FG, GK são eguaes ás tres dadas A, B, C, e o triangulo KFG é o, que se pedia.