nº14
ISSN 0870-7669 Outubro
de 1988
Folha Informativa
do Projecto "Computação no Ensino da Matemática"
OS COMPUTADORES E O ENSINO DA ANÁLISE
ELEMENTAR
por Jaime Carvalho e Silva
1. O crescimento exponencial (1ª parte)
A generalidade dos alunos não possui uma ideia correcta de quão rápido cresce a função exponencial (de base maior do que 1) quando a variável cresce para +. Tal facto pode ser verificado, por exemplo, questionando-os com a lenda da invenção do xadrez, com a questão dos empréstimos grandes mas constantes versus empréstimos pequenos mas sempre a duplicar, ou com a questão da sucessiva dobragem e corte de uma folha de papel vegetal muito fina.É por isso que quando se fala de que certa quantidade cresce exponencialmente os alunos não ficam nada impressionados, e até vemos aparecerem disparates completos no cálculo de limites quando se trata da comparação de uma exponencial com outra qualquer função.
É difícil fazer sentir aos alunos que o crescimento exponencial é mais rápido do que o de qualquer outra função que eles já estudaram, e que essa também é uma das razões do interesse da função exponencial (a propósito: nalgum lado é explicado qual a relevância de tal função? Ou de outra qualquer função?).
Penso que uma das principais razões pela qual os alunos não compreendem este conceito é a de os gráficos que aparecem na generalidade dos livros (não os vi todos!) falharem em um ou dois pontos essenciais:
1. Em nenhum gráfico aparecem simultaneamente traçados os gráficos da função exponencial e de outra função já conhecida (limitada ou não).
2. Os gráficos onde aparece a função exponencial são substancialmente diferentes dos gráficos onde aparecem outras funções num pormenor fundamental: as escalas são sempre diferentes, e até muitíssimo diferentes. Pegando num livro ao acaso ("Compêndio de Matemática, 11º ano, 1º vol, 2ª ed., 1982, M. Garcia, A. Osório, A. Ruivo) verifica-se o seguinte:
(nota: só foram considerados os gráficos que tinham indicadas unidades numéricas)
Conclusões:
a. o número de gráficos que incluem a função exponencial é diminuto quando comparado com o número dos outros (quase tudo de funções polinomiais).
b. para um tamanho de gráfico que não tem variações sensíveis, as unidades utilizadas nos gráficos que envolvem a função exponencial são, em média, sensivelmente maiores do que aquelas utilizadas nos outros gráficos.
Que consequências tem isto? O primeiro ponto é o facto de, utilizando poucos gráficos, não se poder esperar que os alunos se sirvam dos gráficos para ajudar a caracterizar a função exponencial. Segundo, todos os gráficos têm um aspecto muito semelhante, pelo que os alunos tenderão a confundir o gráfico da função exponencial com os outros (nomeadamente com os de polinómios do 2º e 3º grau), não atribuindo especiais propriedades à função exponencial. Os gráficos não são tão parecidos? (por exemplo de e ?).
Desconheço quais possam ser as motivações para utilizar poucos gráficos da função exponencial, e de não os traçar usando o mesmo tipo de referenciais que noutras situações. E isso tem muita influência como veremos. Comparemos pois os gráficos de e de nos dois casos médios acima referidos:
x a variar de -3 a 3 e y a variar de 0 a 3
x a variar de -7 a 7 e y a variar de 0 a 7
Talvez fiquem um pouco surpreendidos por os gráficos parecerem tão diferentes quando nos livros aparecem geralmente com o mesmo aspecto aparente. E, facto insólito, no primeiro gráfico parece que cresce mais rapidamente do que , enquanto que no segundo gráfico parece que cresce mais rapidamente do que !
Que fazer? Aquilo que seria muito penoso fazer à mão, e que o computador nos permite fazer num abrir e fechar de olhos: traçar gráficos mais explícitos.
Comecemos por mudar as unidades, e tomemos unidades diferentes nos dois eixos (de 0 a 7 no eixo dos xx e de 0 a 100 no eixo dos yy):
Trracemos agora um gráfico em que temos um variação de 0 a 70 no eixo dos xx e de 0 a 1000 no eixo dos yy:
Podemos repetir este processo quantas vezes quisermos (se tivermos um computador disponível), mas obteremos agora sempre gráficos do mesmo tipo; tracemos agora um gráfico com uma variação de 0 a 70 no eixo dos xx e de 0 a 2000 no eixo dos yy:
Por aqui se vê que, no intervalo ]0,+[, a função exponencial começa por tomar valores maiores, mas, como inicialmente a função potência cresce mais rapidamente, em certa altura (qual?) ultrapassa a função exponencial; mas, mais tarde, a função exponencial começa a crescer mais rapidamente do que a função potência, pelo que acaba por a ultrapassar (aonde?) e, continuando a crescer mais do que a função potência, cada vez se afasta mais desta.
Verifica-se assim que não é verdade que, para todo o x real positivo
E realcemos que este limite quer dizer exactamente aquilo que se pode intuir do gráfico: Para todo o número real positivo L existe xo tal que, para x > xo,
Este procedimento serve assim também para reforçar a noção de limite: o limite não reflecte o que se passa agora (até se pode passar o contrário), mas sim o que se passa a partir de certa altura.
Verificamos pois que o computador nos permite traçar tantos gráficos deste tipo quanto pretendermos, por nossa inciativa ou a pedido dos alunos, até esta série de conceitos ficarem compreendidos (supondo evidentemente, que os alunos sabem interpretar correctamente um gráfico).
Caso esteja disponível na escola uma sala com computadores, é possível realizar um certo número de exercícios com os alunos para reforçar os conceitos expostos:
1º exercício: sem qualquer introdução, é pedido aos alunos que tracem no computador vários gráficos (sobrepostos ou não) de funções exponenciais e polinomiais. Ser-lhes-á pedido que tipos de comportamento têm umas e outras. (Umas saem do écran mais depressa do que outras, isto é, crescem mais rapidamente);
2º exercício: dadas várias funções ao acaso, identificar pelo crescimento quais podem ser exponenciais e quais podem ser polinómios (atenção que pode induzir em erro, por exemplo a comparação de com ).
3º exercício: que pontos de intersecção entre, por exemplo, e , parecem indicar os gráficos? Procurá-los.
Todos os gráficos que ilustram este texto foram feitos utilizando o programa MICROCALC. Este programa é comandado por uma série de menus (conforme se pode ver na figura junta, com o exemplo do menu para o traçado de gráficos de funções) pelo que é extremamente fácil manejá-lo e assim obter rapidamente todos os gráficos pretendidos.
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