NONIUS
nº15 ISSN 0870-7669 Nov.-Dez. 1988 / Jan. 1989
Folha Informativa do Projecto "Computação no Ensino da Matemática"

EDITORIAL

Foi posto recentemente à discussão o "Ante-Projecto de Sistema de Formação Contínua dos Docentes do Ensino Não Superior - Bases Gerais". Penso que o Projecto "Computação no Ensino da Matemática" se deve preocupar com o seu conteúdo, pois um dos objectivos do nosso Projecto é exactamente o de colaborar na formação contínua (por exemplo, através da colaboração nos Cursos de Actualização promovidos pelo Departamento de Matemática da Universidade de Coimbra).

 

É altamente louvável que se pretenda ordenar juridicamente a formação contínua de professores, o que, juntamente com as exigências de formação contínua para progressão na carreira docente do ensino não superior, certamente contribuirá para o desenvolvimento da formação contínua, e, em última análise, para a melhoria da qualidade do Ensino.

É extremamente positiva a criação de Centros de Professores como Centros de encontro, discussão e difusão de experiências no campo do ensino das diversas disciplinas. Que os recursos postos à sua disposição permitam que funcionem com eficácia.

O Ante-Projecto merece no entanto alguns reparos. É totalmente desnecessária a existência de coordenação a nível nacional por meio de um orgão central do Ministério da Educação; com efeito, por um lado, as carências e necessidades são sentidas pelos professores em cada escola, com naturais variações segundo as diversas regiões, não devendo pois as diversas formações ser impostas a partir do Ministério; por outro lado, quem vai fazer a formação contínua tem necessariamente ideias diferentes sobre o modo de fazer essa formação, não sendo lícito obrigar docentes a leccionar segundo pontos de vista que não são os seus; por fim, a circulação de informação (necessariamente escrita, ou por correio electrónico) pelos diversos Centros de Professores é mais eficientemente feita de um Centro a outro. A coordenação a nível nacional, a existir, deveria ser feita pelo colégio dos directores dos Centros de Professores.

Da constituição dos Centros de Profesores ficam excluídos os docentes do Ensino Superior, o que não parece absolutamente nada razoável. Aliás os docentes do Ensino Superior ficaram já excluidos de um recente concurso organizado pelo Instituto de Inovação Educacional sobre Projectos de Inovação em Educação. Porquê? Por um lado, as instituições do Ensino Superior colaborarão, de acordo com o Ante-Projecto, na formação contínua a diversos níveis, nomeadamente fornecendo material e promovendo a investigação pedagógica. Por outro são institui_ções que já efectuam formação contínua ou possuem equipas de investigação pedagógica a trabalhar como é o caso do Projecto "Computação no Ensino da Matemática". Cabe aliás aqui um parentesis na medida em que as Faculdades de Ciências (e os seus Ramos Educacionais) são sistematicamente omitidos no Ante-Projecto, sendo apenas referidas as Escolas Superiores de Educação e os CIFOPs. Porquê?

Um Centro de Professores para funcionar de modo a ter credibilidade científica e pedagogica deverá ser dirigido por um Conselho de Professores que seja um verdadeiro Conselho Pedagogico-Científico constituido por pessoas de reconhecida competência e experiência, que orientem efectivamente os trabalhos do Centro de Professores, nomeadamente a selecção do "núcleo dos organizadores da formação" cujo recrutamento só será transparente se for sempre efectuado por concurso!

Um reparo sobre as prioridades de Formação Contínua contidas no Ante-Projecto. A Formação Contínua deverá ser dirigida para os professores profissionalizados e não a "todos os professores (...) independentemente da sua categoria e situação profissional". Aos professores não profissionalizados devem ser dadas condições de efectuar primeiro a sua formação inicial e não inverter a situação que seria aliás caricata! Nomeadamente a prioridade de formação contínua atribuida aos "professores dos ensinos preparatório e secundário sem habilitação própria e com vínculo, para complemento de habilitações académicas e profissionais" é totalmente ridícula: como se pode fazer formação contínua de algo que não começou? O Ministério da Educação deve é rapidamente dar condições a esses professores de obterem a sua habilitação própria e não tentar remendar uma situação lesiva da qualidade de ensino. Uma observação semelhante se aplica à prioridade estabelecida para os professores dispensados do 2º ano de profissionalização; não significa isso reconhecer que a formação inicial que lhes foi fornecida foi insuficiente? Sendo assim, o Ministério nunca os deveria ter dispensado desse 2º ano! Em resumo: não se confunda formação inicial com formação contínua!

Por último uma observação sobre "as prioridades resultantes de formação em áreas específicas". A única matéria mencionada são as Ciências de Educação. Não é referido em que sentido é tomada tal expressão; mas não conterá provavelmente as Metodologias e Didacticas de Ensino das diversas disciplinas, o que é negativo, pois estas assumem um caracter de verdadeira indispensabilidade para a prática de qualquer professor (a formação inicial apenas pode ser um início neste campo) e constituem uma área onde a investigação é tão escassa e necessária. Os Centros de Professores deveriam assim organizar-se à volta das Metodologias e Didacticas de Ensino de cada disciplina, sem esquecer a indispensável interacção entre as diversas disciplinas.

Jaime Carvalho e Silva
(Responsável do Projecto "Computação no Ensino da Matemática")

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