nº18 ISSN
0870-7669 Maio
1989
Folha Informativa
do Projecto "Computação no Ensino da Matemática"
DESENVOLVER UM PROGRAMA EDUCATIVO
por Nuno J. Madeira
0- Introdução.
No momento em que a Comissão Nacional do Projecto Minerva, promove o 1º Concurso Nacional de 'Software' Educacional, será esta a altura ideal para nos debruçarmos sobre as fases de desenvolvimento de um programa educativo, e principalmente dos esforços e metodologias já experimentadas no intuito de se produzirem programas que sejam efectivamente utilizáveis.
Este texto foi baseado numa resenha feita por Nuno J. Madeira [MAD88], aquando do desenvolvimento de um programa educativo no domínio da Biologia-Ensino Secundário.
1- Metodologias de caracter individual
As primeiras metodologias que se conhecem para o desenvolvimento de programas educativos datam dos tempos mais remotos do Ensino Assistido por Computador.
Nessa altura, os programas eram essencialmente desenvolvidos por pessoas individuais (geralmente um professor), que viam no uso do computador uma nova possibilidade de ensino. Essa pessoa fazia todo o trabalho: planeava, desenhava estruturas, implementava, fazia a revisão e a avaliação. Geralmente o resultado era frustrante, visto que o programa desenvolvido visava geralmente necessidades próprias e o programa perdia a possibilidade de um uso mais geral no ensino.
Estes programas eram tipicamente pequenos produtos isolados, sem qualquer possibilidade de serem englobados em séries de programas visando assuntos sequencais, com vista a uma utilização efectiva no ensino.
Para além de ser um professor a desenvolver os seus programas, existiam também programas para o ensino feitos apenas por um programador, idealizando ele próprio o tema sem qualquer contacto com professores especializados no assunto desenvolvido no programa.
De qualquer modo, e independentemente de todas estas questões, continuam a ser desenvolvidos programas para o ensino por pessoas individuais - programadores ou professores.
2- Metodologias de grupo.
Com todos os problemas sentidos nas metodologias de caracter individual, passou-se para outro tipo de metodologias de desenvolvimento de programas educativos. Devido a todos esses problemas indicados atrás, a lógica apontaria para a criação de uma certa interacção de especialistas de diversas áreas. Foi isso que se fez, e este tipo de metodologias geralmente designam-se por metodologias de grupo.
Nestas metodologias, grupos diferentes encarregam-se de partes diferentes do esquema de desenvolvimento.
Uma metodologia de grupo geralmente utilizada como exemplo é a metodologia desenvolvida por Alfred Bork [BOR85] cujas etapas de desenvolvimento se podem esquematizar da maneira que a figura 2. traduz, e cujo desenvolvimento dessas etapas descreveremos a seguir de uma forma sucinta.
O grupo que se vai encarregar do plano inicial, é um grupo de pessoas de diferente formação. Neste grupo há uma pessoa com conhecimentos adquiridos em experiências anteriores de Ensino Assistido por Computador, para se poder fazer um bom uso de todo o material disponível, a nível principalmente de programação; há também neste grupo uma pessoa que tem conhecimentos sobre investigação relacionada com metodologias de ensino, em particular no que diz respeito a modos de planeamento; finalmente, este grupo também deverá conter bons professores, que conheçam profundamente o assunto e que tenham conhecimento sobre as reacções dos alunos no que diz respeito ao modo de reagir a novas situações.
A concepção pedagógica deve ser feita por um pequeno grupo (3 a 5 pessoas) que trabalham juntos, sobre esse aspecto durante um período de tempo relativamente curto (1 a 2 semanas). A composição deste grupo pode ser a mesma que a do grupo de planeamento.
Depois da fase de concepção pedagógica decide-se o que deve aparecer no écran. Nesta fase deve permanecer - junto ao grupo de desenvolvimento um perito de programação, que indique as possibilidades gráficas, de texto e de animação, de modo a que se chegue à forma desejada. Segue-se a fase de implementação do programa, seguida da revisão global. Finalmente, é feita a avaliação do programa por professores e alunos, de maneira a que se possa concluir se foram ou não atingidos os objectivos propostos. Neste tipo de inetodologias podem haver problemas, na medida em que as pessoas envolvidas. no projecto porque têm diferentes formações, e muito frequentemente usam terminologias diferentes. Para evitar este problema pode-se passar por uma fase designada por "fase de treino" [BOR84] , em que os especialistas de certos assuntos tentam integrar-se o mais possível nos assuntos de que não são especialistas. Nesta fase são por exemplo, mostrados às pessoas ligadas ao ensino, vários programas que façam uso da maior quantidade possivel do material tecnológico disponível.
A metodologia usada no projecto "Schools Council and Microelectronies Education Program", Chelsea College-Inglaterra, descrita por Deryn M. Watson [WAT83], baseia-se no modelo CIC (Computers in the Curriculum Project), em que a interacção para a definição do tópico e concepção pedagógica é feita entre os módulos representados na figura 3.
Nesta metodologia a parte de definição do tópico e de concepção geral é deixada a cargo de entidades: Instituto Educacional, Grupo CAL, Autoridades Educacionais Locais e Grupo de Inovação de Currículum. A parte de desenvolvimento do projecto é deixada a cargo de um pequeno grupo com uma constituição basicamente igual à definida por Alfred Bork. É interessante notar que por vezes o tópico é definido à custa de programas anteriormente desenvolvidos por metodologías de caracter individual; o objectivo é claramente a intenção de melhorar esse programa.
Uma outra metodologia de grupo é a utilizada no "Centrum voor onderjwics en informtietechnologie" (COI), Enschede-Holanda, que tem como orientador do projecto Jef Moonen [MOO86]. Esta metodologia define como supervisares do projecto dois indivíduos. Um é o lider do projecto que tem experiência acumulada devido à sua participação em trabalhos anteriores, que selecciona os participantes dos grupos de concepção pedagógica e de desenvolvimento. O outro indivíduo é um investigador em técnicas de ensino, que vai fazer a ligação entre os indivíduos ligados à parte educacional e os indivíduos ligados à parte técnica, visto que este investigador possuí conhecimentos de técnicas de ensino e também de computadores.
Nesta metodologia há também uma diferença no que se refere à fase de implementação; o protótipo é feito num computador de grande porte e posteriormente distribuído pelos centros onde vai ser usado, onde se utilizam computadores de pequeno porte.
Uma outra metodologia que convem reter é a que se utiliza na "Open University" Universidade Aberta), Milton Keynes - Inglaterra, que tem como líder do projecto P.J. Murphy [MUR81a] [MUR81b]. Aqui também existe um supervisor do projecto, que é responsável pelo bom andamento do processo para que se cumpram os prazos prefixados. O grupo de desenvolvimento é também constituído por pessoas de diferente formação podendo ser convidados especialistas de determinado assunto a permanecer junto ao grupo durante um certo período de tempo. Os especialistas que podem ser convidados são por exemplo técnicos de T.V., visto que a Universidade Aberta se dedica a ensino à distância em que se faz uso de meios audio-visuais.
Existem outras metodologias de grupo, como as referidas no artigo G. Keasley [KEA85], onde se faz uma resenha das principais metodologias usadas para o desenvolvimento de programas educativos.
Os aspectos focados nas metodologias descritas atrás não envolvem aspectos particulares, relacionados por exemplo com urna fase de pré-preparação, com o melhor modo de saber o que deve aparecer no écran, com regras gerais de implementação ou ainda com o problema de saber qual a linguagem de implementação que se deve escolher.
Vários autores se dedicaram ao estudo destes aspectos particulares.
No que diz respeito à fase inicial que se poderá chamar de pré-preparação (depois da definição do tópico), deve-se fazer uma pesquisa sobre os trabalhos desenvolvidos até ao momento em assuntos análogos [BOR84].
O CBI (Computer Based Instuction) liderado por Greg Kearsley [KEA85] enumera alguns princípios básicos que se devem utilizar na concepção pedagógica e sobre a maneira de melhor utilizar o écran. Esses princípios foram concebidos de maneira a se fazer o melhor uso possível das capacidades de interacção.
Em relação à fase de concepção pedagógica Keith Hudson [HUD84] apresenta uma sequência do que deve aparecer no écran do computador para se desenvolver um programa educativo sobre um assunto específico de Biologia.
Visando aspectos relacionados com uma boa implementação de maneira a se produzir um diálogo efectivo programa-utilizador vários autores se dedicaram à criação de regras específicas, como por exemplo Neil Rowe [ROW81] e B. R. Gaines[GAI81].
Há ainda a questão da linguagem de implementação a utilizar. Alfred Bork [BOR84] diz que uma boa escolha para a linguagem de implementação de programas educativos é a linguagem Pascal, devido a ser uma linguagem que assenta em programação estruturada, facilitando possíveis revisões e devido também a existir uma vasta gama de software de aplicação disponível. Outras linguagens poderão ser utilizadas, não esquecendo linguagens como o LISP ou PROLOG, para a implementação de programas em que seja conveniente recorrer a técnicas de Inteligência Artificial. Num ponto de vista mais geral, a escolha da linguagem deve ser feita depois de cuidada ponderação, envolvendo factores tais como as características do projecto e o equipamento técnico de que se dispõe.
3 - Experiência Portuguesa em Metodologias de Desenvolvimento.
A metodologia descrita em [MEN86b] e utilizada em [MAD88], é extremamente sensata e foi desenvolvida com base em conhecimentos acumulados até ao momento nas experiências feitas no âmbito do projecto MINERVA, pólo de Coimbra.
É uma metodologia onde é salientada a importância de cada membro do grupo de desenvolvimento sentir como seu o produto final, dando assim o seu máximo esforço para o desenvolvimento do processo.
A metodologia engloba quatro fases principais:
- Definição do tópico.
- Concepção pedagógica.
- Desenvolvimento técnico.
- Avaliação e revisão.
Um dos aspectos importantes desta metodologia é o facto de não ser muito rígida, sobretudo no que se refere ao desenrolar cronológico das diversas fases, podendo ser adaptada às condições específicas do projecto entendido como um todo.
Definição do tópico.
Esta fase envolve diversos grupos de indivíduos compreendendo professores de escolas secundárias, orientadores pedagógicos, investigadores da Escola Superior de Educação e investigadores do grupo de Ensino Assistido por Computador (EAC).
Esta fase compreende várias reuniões onde são sugeridos tópicos pelos professores e onde se fundamenta a sua importância para o desenvolvimento de um programa educativo. São também discutidas maneiras de como o assunto deve ser explorado por um programa de computador. Para além disto, na definição do tópico deverá ser considerada a sua integrarão na inovação de currículos existentes.
Concepção pedagógica.
Este estado de desenvolvimento envolve tipicamente dois ou três professores, um orientador pedagógico, um elemento do grupo Ensino Assistido por Computador (EAC) e um investigador da Escola Superior de Educação,
Novas reuniões são feitas para se definir a forma como o computador deve ser usado. Além disso são também considerados os ambientes de ensino a serem criados para o uso do programa.
De uma forma geral, a concepção pedagógica consiste numa completa organização do programa, incluindo diálogos, modos de representação gráfica e animação.
Desenvolvimento técnico
O desenvolvimento técnico e a documentação são feitos por investigadores do grupo de Ensino Assistido por Computador (EAC); no entanto, a elaboração de documentação pedagógica é feita por professores e orientadores pedagógicos já envolvidos nas fases anteriores.
Aqui são seleccionados as técnicas a serem usadas no programa de acordo com a linguagem de implementação, bem como questões relacionadas com os periféricos a utilizar ou a ligação do computador a outros meios (vídeo, projector de diapositivos, experiência de laboratório, etc).
Avaliação e revisão.
O processo de avaliação envolve diversas fases e é prolongado durante um período de tempo relativamente grande [MEN86a].
A primeira das fases envolve grupos de professores, orientadores pedagógicos e um investigador da Escola Superior de Educação.
E utilizada uma lista de avaliação, que contém diversos items distribuídos por quatro secções distintas: conteúdo, qualidade de ensino, qualidade técnica e apreciação global.
A lista preenchida é discutida pelos grupos e a versão inicial do programa é revista.
A fase de avaliação acompanha cronologicamente praticamente toda a implementação, por produções de versões sucessivas, revistas e melhoradas.
A última fase de avaliação envolve alunos, individualmente e em grupos na sala de aula. Aqui são usados elementos das listas preenchidas pelos alunos, resultados da análise das entrevistas feitas a professores e alunos e ainda resultados da observação dos alunos na sala de aula.
BIBLIOGRAFIA
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[HUD84]-Hudson, K. (1984). Introductiction CAL : A Practical Guide to Writing ComputerAssisted Learning Programs. Chapman and Hall, Ltd.
[KEA85]-Keasley, G. (1985). Mícrocomputer Software: Design and Development Principles. Journal of-Education Computing Research., Vol 1 (2) , pp 209-220. Baywood Publishing Company Co., Inc.
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